Que linguística eu deveria estudar?

O título deste texto replica uma pergunta ouvida em aula, agora que o semestre vai chegando ao fim. Os professores seguem visões diferentes. Como decidir?

Parece que ninguém fala a mesma coisa

Num livro de ficção científica da década de 1960, o narrador começa a estudar linguística na busca de conseguir entender o sinal captado do espaço. Logo se desilude: as autoridades da área da linguística não se entendiam nem no tocante a conceitos básicos, como fonema ou morfema.

Immediately on my arrival at the Project I began studying linguistics, because that seemed imperative to me. I was soon amazed to learn that, when it came to the primary, most fundamental concepts in this field — a field supposedly precise, quantified, mathematized — there was absolutely no agreement. Why, the authorities could not come together on so basic and preliminary a question as what exactly morphemes and phonemes were.

A decepção do narrador parece derivar da crença, ingênua, de que encontraria certezas em alguma área de estudo. Cada teoria olha para a grande diversidade do mundo e recorta seu foco de interesse. As teorias refletem o “trabalho humano sobre a realidade”, como defendiam Dascal & Borges Neto (1991: 18).

Uma questão de curiosidade pessoal

Cada um tem de descobrir do que gosta. Também na linguística. E lembro aqui de Lenneberg, na página inicial de um livro que marcou parte de uma geração de linguistas, o famoso Biological Foundations of Language:

O estudo da linguagem é pertinente para muitos campos de investigação. É relevante para a psicologia, a antropologia, a filosofia e a medicina. Invade as humanidades, assim como as ciências sociais e as ciências naturais. Podemos conduzir pesquisas que se concentrem no que homem fez com determinada língua ou para línguas específicas; ou podemos considerar a linguagem como um fenômeno natural – um aspecto da natureza biológica, a ser estudado da mesma maneira como, por exemplo, a anatomia. Qual dessas abordagens deve ser escolhida é uma questão de curiosidade pessoal.” (Lenneberg, 1967: vii).

Mas como descobrir isso?

“Tenho pressa e tanta coisa me interessa, mas nada tanto assim”

Se a ideia é entrar no mundo da pesquisa, de participar da Iniciação Científica, as leituras não terão o limite máximo de 280 caracteres. Não importa o quanto de cansaço as cinco horas diárias passadas no transporte público vão produzir, há muito que ler. E com atenção.

E aí , nas leituras, a partir dos argumentos e contra-argumentos descobrimos para que lado pende nosso interesse.

Referências

LEM, Stanislaw. 1968. His Master’s Voice. Transl. into English Michael Kandel. New York: Harcourt Brace Jovanovich, 1983.

LENNEBERG, Eric H. 1967.Biological Foundations of Language. With appendices by Noam Chomsky and Otto Marx. New York, London, Sydney: John Wiley and Sons.


Durante a presente pandemia, comecei a postar neste blogue, ainda em 2020, pequenos textos escritos primariamente para as minhas turmas de Linguística I, que em geral concentram alunos dos cursos de Grego, Latim, Árabe, Hebraico, Japonês e Russo. São, por conseguinte, textos voltados para um aluno recém-saído do Ensino Médio, iniciante na Linguística. As citações nas línguas dos cursos desses estudantes, quando presentes, são propositais.

2022: Morte em Veneza, a obra-prima de Thomas Mann, completa 110 anos. Uma lição sobre interesses econômicos e saúde pública.


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